Sobre a violência e a tristeza
Acho que existem realmente dois problemas fundamentais, violência e tristeza. A menos que os resolvamos e os ultrapassemos, todos os nossos esforços, nossas constantes batalhas, têm muito pouco significado. Parece que passamos a maior parte de nossas vidas no campo das ideologias, fórmulas, conceitos, e por meio deles tentamos resolver esses dois problemas essenciais, a violência e a dor.
Toda forma de conflito é violência, não só o conflito psicológico, dentro da pele, mas também exteriormente, nas nossas relações com outros seres humanos, com a sociedade. E a dor, parece-me, é um dos problemas mais complexos e difíceis; a própria complexidade disso precisa ser abordada de maneira muito simples.
A tristeza, a auto piedade que faz parte dessa tristeza, a solidão, a total falta de sentido da vida, o tédio, a rotina, privam a vida de todo senso de propósito, então inventamos propósito; os intelectuais elaboram propósitos ideológicos segundo os quais tentamos viver. E não sendo capazes de resolver esses problemas, voltamos a algo que foi, seja na nossa juventude, seja na cultura da tradição, dependendo da raça, país e assim por diante. Quanto mais o problema se torna urgente, mais escapamos a alguma forma de explicação ideológica do passado ou a algum conceito ideológico do futuro, e ficamos presos nessa armadilha. E observa-se, tanto no Oriente como no Ocidente, as fugas para todas as formas de entretenimento, seja o entretenimento da Igreja, ou o entretenimento do futebol, ou o cinema – e todo o resto.
Não se pode confiar em ninguém, em salvadores, mestres, nem em ninguém, incluindo o orador. E quando rejeitamos totalmente todos os livros, filosofias, santos e anarquistas, estamos frente a frente com nós mesmos como somos. Isso é uma coisa assustadora e bastante deprimente: nos vermos realmente como somos. Nenhuma quantidade de filosofia, nenhuma quantidade de literatura, dogma, ritual vai resolver essa violência e tristeza. Acho que, em última análise, é preciso chegar a este ponto e resolver e ir além.
Não se pode entender nada intelectualmente – você pode ouvir palavras, dar explicações, descobrir a causa, mas isso não é entender. A compreensão – como se observa a si mesmo – ocorre apenas quando a mente, incluindo o cérebro, está totalmente atenta. E não se está atento quando se está interpretando e traduzindo o que se vê de acordo com seu background. Você deve ter notado que quando a mente está completamente quieta, não exigindo, não se preocupando, não despedaçando o problema, é que realmente enfrenta o problema com completa quietude e então há um entendimento. Essa mesma compreensão é a ação, a força ou energia libertadora, que nos liberta do problema; compreensão é ação imediata.
Texto de J. Krishnamurti – Paris 1967