A ARTE DE VIVER
Ocupe-se apenas do que você pode controlar. Mantenha sua atenção inteiramente concentrada no que de fato lhe compete e tenha sempre em mente que aquilo que pertence aos outros é problema deles, e não seu. Se agir assim, estará imune a coações e ninguém o poderá reprimir. Será verdadeiramente livre e eficiente em suas ações, pois seus esforços serão canalizados para boas atividades, e não desperdiçados em críticas ou confrontos com outras pessoas. Tendo conhecimento e dando atenção ao que de fato lhe compete, não será obrigado a realizar qualquer coisa contra sua vontade. Os outros não poderão feri-lo, você não fará inimigos nem será prejudicado. Se o seu objetivo é viver de acordo com esses princípios, lembre-se de que não será fácil: você deverá abrir mão de algumas coisas e adiar outras. É possível que até mesmo precise privar-se de riquezas e poder se quiser atingir a felicidade e a liberdade.
Reconheça as aparências pelo que realmente são. De agora em diante pratique dizendo para tudo o que
parecer desagradável: “Isto é só aparência e de modo algum o que parece ser.” E, então, examine cuidadosamente a questão de acordo com os princípios que acabamos de considerar. Em primeiro lugar: “Esta aparência se refere às coisas que estão sob meu controle ou às que não estão?” Se a questão estiver relacionada com qualquer coisa fora de seu controle, treine a si mesmo para não se preocupar com ela.
Veja as coisas como elas são. As circunstâncias não ocorrem para atender às nossas expectativas. Os fatos
acontecem como têm de acontecer. As pessoas comportam-se de acordo com o que são. Acolha as coisas que de fato conseguir. Abra os olhos: veja as coisas como elas são e preserve-se assim da dor causada pelos falsos apegos e os estragos evitáveis. Pense no que lhe dá prazer: os instrumentos, sejam quais forem, de que você depende, as pessoas que lhe são caras. Mas lembre-se de que cada uma delas tem caráter próprio, separado, independentemente da maneira como as vemos. Como exercício, pense nas menores coisas às quais você está ligado. Por exemplo, vamos supor que você tenha uma xícara favorita. É, afinal de contas, apenas uma xícara e, caso ela se quebre, você pode lidar com o fato. Em seguida, passe para coisas mais importantes–ou pessoas– às quais você se sente mais apegado. Lembre-se sempre, por exemplo, quando abraçar seu filho, seu marido ou sua mulher, de que está abraçando um ser mortal. Assim, se um deles morrer, você será capaz de suportar a dor da perda com maior serenidade. Quando algo acontece, a única coisa que está em seu poder é sua atitude com relação ao fato. Suas alternativas são a aceitação ou o ressentimento. O que realmente nos assusta e desanima não são os acontecimentos externos em si, mas a maneira como pensamos a respeito deles. Não são as coisas que
nos perturbam, mas a forma como interpretamos seu significado. Pare de se atemorizar com noções
irrefletidas, reações impulsivas e com suas impressões sobre como as coisas são! As pessoas e as coisas não são como desejamos que sejam, nem o que parecem ser. São aquilo que são.
Harmonize suas ações com a maneira como a vida é. Não tente fazer suas próprias regras. Comporte-se, em todas as questões, grandes e públicas, pequenas e domésticas, de acordo com as leis da natureza.
Harmonizar sua vontade com a natureza deveria ser o seu maior ideal. Onde você pode praticar esse ideal? Nos detalhes de sua vida diária, com suas tarefas e seus deveres pessoais e específicos. Quando realizar essas tarefas, tais como tomar banho, por exemplo, faça-o, tanto quanto lhe for possível, em harmonia com a natureza. Quando comer, tanto quanto lhe for possível, faça-o em harmonia com a natureza. E assim por diante. O que fazemos é menos importante do que a maneira como o fazemos. Quando compreendemos realmente esse princípio e vivemos de acordo com ele, embora as dificuldades continuem a surgir–já que também são parte da ordem divina–, ainda assim será possível ter paz interior.
Não são os acontecimentos que nos ferem, mas a visão que temos deles As coisas em si não nos ferem ou nos criam obstáculos. Nem as outras pessoas. A questão está na forma como as encaramos. São nossas atitudes e reações que nos criam problemas. Sendo assim, até a morte deixa de ser tão importante. É a nossa noção da morte, a ideia que fazemos dela que é terrível, que nos aterroriza. Existem muitas maneiras de pensar na morte. Examine suas noções a respeito da morte–e também sobre tudo o mais. Essas noções são de fato verdadeiras? Fazem algum bem a você? Não tema a morte ou a dor, tema o medo da morte ou da dor. Não podemos escolher as circunstâncias externas de nossa vida, mas sempre podemos escolher a maneira como reagimos a elas.
— A arte de viver de Epicteto